Cartas para Jurema #4

Disse que mandaria notícias de longe, mas caminhei poucas milhas desde a última carta; passinho bem pequenos, mas firmes, Vó — eu juro.

Stella Monteiro
2 min readAug 25, 2021

Acontece que agora estou com muito medo. Tomar decisões nos últimos dias fez a vida tomar um formato completamente inesperado. Aqui estou, vivendo coisas muito novas pra mim, sentindo coisas que não sentia antes e que me parecem agora meio fora do lugar.

Eu jamais senti medo de me expor ao desconhecido. É claro que já temi falar em público, já temi receber um não como resposta, já estremeci diante da chance de não ser amada de volta e rejeitei incialmente o que seria novo. Mas, não me lembro de ter deixado de falar, perguntar, amar ou experimentar algo novo muitas vezes como resposta ao medo que obviamente me assombra também. Principalmente no que diz respeito a demonstrar afeto, acredito que sempre me faltou uma dose a mais de amor próprio. É verdade, vó, sua neta já se expôs muito, de diversas formas, sem exagerar na dose de ousadia muitas vezes. Dessa coragem — e da falta de noção, algumas vezes — colhi muitas cicatrizes, mas que hoje não doem mais e me lembram que dei o meu melhor, mas que sou limitada e dependente da soberania de Deus nas coisas grandiosas e nas pequenas também.

Agora, estou diante de uma situação nova. Pela primeira vez em muitos anos, olho daqui e vejo a chance de ser magoada e não quero tentar. Dificilmente me vi nessa situação agridoce de querer muito alguma coisa, mas enxergar tão claramente o risco de dar vazão a isso. São tamanhos, o querer e o risco, que agora não sei o que fazer. O que faz alguém enquanto coloca em cheque o próximo passo? Até que ponto devemos nos expor ao risco da mágoa, Vó? Estou com a boca agridoce desde ontem e não sei como agir.

“Bittersweet” é a palavra em inglês pra algo que antes me remetia a molho de comida chinesa e que dá nome a uma música linda da Lianne La Havas. Essa palavra hoje me remete a um nome, um sobrenome, um cheiro gostoso de saudade e um sorriso que me aquece como nenhum outro.

Darei mais um passo, vó, e mando notícias.
Um abraço,
Stella.

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Stella Monteiro

pés descalços, bilhetes escritos à mão, café, prosa boa, Cristo e pão.